anjo afogado
poema
de Caê Guimarães
O ANJO AFOGADO
você fuma seu marlboro e dentro das calças sente
tesão e medo
eventualmente você mente, e embora tente
quase nunca sente pelo mundo
você respira fundo antes de dizer o que acha ser verdade
e em cada pausa uma nódoa, uma náusea
uma rosa virada ao avesso
você acessa sites
e seus gigabites tornam o fim o seu começo
você quebra a banca, banca o foda
e tal e qual a lesma, toda prosa
lambe o musgo do muro para não morrer de fome
você some na hora em que o bicho pega
nega por três vezes quem jurou defender
estica o dedo em riste e come alpiste com shake para
emagrecer
você caga e anda e sangra a cada dia
uma gota da agonia
que insiste em não ver
você assina o cheque
você risca a porta
e o som metálico do seu hálito faz jus a quem você diz
ser
você ri do que?
quando pinta algo além da sua finta
perde o rebolado e bota tudo a perder
você encontra e
esconde – porque quer tudo
e ao reter engorda, e ao engordar explode
tudo que não soube dividir ou conter
você chora quando vê algo terrível
e pensa que podia ser com quem ama ou com você
tenta engolir mas engasga a verdade lamacenta e nodosa
leva as mãos às faces distorcidas pelo horror
ao perceber que o anjo, ainda que alado
também morre afogado
e aí nada mais há a fazer
nem por você, que sou eu
nem por mim, que sou você

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