mulheres pasto
poema de Angela Maria Quinto
MULHERES
PASTO
Aí você sai da feira literária, aquela
que se diz a primeira: A
que trouxe a santíssima trindade dos
excluídos para a cena principal, em poetry form
Aí você entra na cidade tomada e se
pergunta que acordo foi feito para tudo acontecer em clima de festa
Aí você permanece de cabeça raspada,
virada, com o corpo desencaixado cortado por questões cabeludas
Aí você vive na própria pele alva, a
impossibilidade de espelhamento com seus velhos pares
Aí você é jogada dentro de uma casa de
artista com tantas trancas trincos tramelas e desconfia que a palavra perigo
comece com t maiúsculo
Aí tudo sugere que você desconecte os
filamentos eletromagnéticos entre vida poesia política e corpo. Aí você mesma
enfraquece a corrente dos movimentos eróticos por uma paixão inconfessável.
Aí só um cordão energético pode se manter
ligado, o da plaquinha: Vende-se
E aí depois de tanto derivar, é
convidada a deixar a festa pelo portão dos fundos, e, é espantosamente jogada
num pesadelo. Aquele que por semanas teima em não se transformar em poema.
Aquele pesadelo que se descola da própria experiência e cria um vácuo entre
você e você
Tudo se deu na visage do maior milagre
da cristandade: a união das 3 figuras da santíssima trindade dos excluídos numa
só pessoa
Aí você me pede para explicar: do lado
de fora do portão está uma mulher (1) negra (2) de cabelos lisos índio (3)
chupando manga do lado de fora de sua casa de rua, impecavelmente limpa e com
enfeites natalinos, mais 2 cães de rua que pertencem a ela.
Aí você como boa cristã quer dar bom dia
àquela pessoa
Aí você é barrada discretamente por 1
par de olhos azuis trancados em T ,e, quando insiste em olhar para o outro par de olhos escuros, estes, se negam
a olhar para os seus.
Aí você percebe que é a única pessoa afetada
por esta cena assustadoramente humana
Aí você paralisa o corpo. Só o olhar
vive, em afasias
Aí você pega a estrada e em todas as
árvores vê esqueletos quebrados, naufrágios, bocas fechadas, corpos borrões,
mulheres pasto e cães de rua
E aí?

Comentários
Postar um comentário