tapetum lucidum

poema de Alex Simões





tapetum lucidum

nem queria dizer, mas vou, meu cu
não é problema seu, mas qual o quê,
meu pau não é da sua conta, mas
você quer se meter, quem é você

que vem se intrometer, minha xoxota,
meus pentelhos, meu útero, a quem
eu devo confiar as minhas contas,
minha mastectomia, minhas crenças,

minhas descrenças, minhas preferências
estéticas, meu histórico do Google,
meu nome social, minha posição
seja de ideias, seja sexual,

a orientação, a identificação
de gênero, minha não binariedade,
minha filiação a tal partido,
meu anarquismo, meu salvo conduto,

minha lista de compras, minha conta,
o que aprendi na escola, o que ensinei,
a cor da minha pele, meus cabelos,
o nome de batismo, a apostasia,

minhas metamorfoses, minhas dúvidas,
meus medos, meu lugar de fala ou falha
meu calcanhar de Aquiles, minhas pregas,
 meus filhos no museu, meus outros eus.

não queria dizer, mas quem são eles,
não fôssemos às vezes nós fazendo
as vezes deles sem nos entendermos.
as nossas diferenças são iguais,

maiores ou menores do que as deles.
nossas pedras jogadas contra nós
e mais as pedras deles enquanto eles
nos catapultam, nossos estilingues

bem sabem sermos peças de um xadrez.
não esquecer que se eles trazem trevas
podemos nos mover na escuridão:
justo no breu é que melhor dançamos.


Comentários

  1. Quem são eles? São seres mórbidos! Belo poema!!

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  2. Poema belo. Sim, nos movemos mesmo na escuridão! Parabéns pela síntese Alex!

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  3. Muito bom, resume nossa privacidade, nossos desejos, nossas escolhas e individualidades. Do meu corpo eu faço eleições, eleições, apenas isso. Afinal, o corpo está para paisagens a serem percorridas. Super!

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  4. A dança do corpo, a dança da alma, a dança do breu e o breu, que também dança...

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  5. "...justo no breu é que melhor dançamos". Gostei...
    Muito bom!!!

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  6. Adorável! Necessário. Urgente. Vc existe!

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