a alma do negócio
poema de
Aldo Votto
a
propaganda é a alma do negócio
Se
queres cegar a todas e todos
Sobre
seus tantos problemas reais
Dá-lhes
mais nonadas à atenção
Mais
coisas irrelevantes e banais
Dá-lhespornografia
nas mamadeiras
Dá-lhes
roupinhas rosas e azuis
Dá-lhes
tomadas de três pinos
Dá-lhes
menos pontos nas carteiras
Se
queres entregar seu patrimônio
Abandone-o
em plena anemia
Dá-lhes
a má impressão, deixe-o à soga
Depois
denunciaa fraqueza como bulimia
Dá-lhes
leilões risonhos na Bolsa de Valores
Dá-lhes
fotos de casacos deixados nas cadeiras
Dá-lhes
muitos marajás caçados sem piedade
Dá-lhes
manchetes de milhões e probos auditores
Se
queres que volte a escravidão
Que um
emprego seja dádiva divina
Dá-lhes
veneno em gotas a cada manhã
E aos
poucos vai empurrando o facão
Dá-lhes
demissões incentivadas
Dá-lhes
grandes contratos pê-jota
Dá-lhes
a extinção da cê-ele-tê
Dá-lhes
as reformas desbragadas
Se
queres perpetuar a vilania
Chama-a
de medida provisória
Dá-lhes
a ideia que vai passar
E que,
no fim, chegará a melhoria
Dá-lhes
aviões de estrangeiros
Dá-lhes
ministérios novos-velhos
Dá-lhes
terras indígenas desmarcadas
Dá-lhes
sindicatos sem dinheiro
Se
queres que ninguém resista
Que
todos engulam sem mastigar
Trata-os
como o velho público da Xuxa
E banca
um papai noel, ainda que fascista
Dá-lhesarminhas
feitas com as mãos
Dá-lhes
português de primeiro ano
Dá-lhes
camisetas de times de futebol
Dá-lhes
bandidos chamados de irmãos
Se
queres que não mais se pense
Que o
fígado suba para o crânio
Dá-lhesemoções,
o importante é que...
Com elas
é o irracional que vence
Dá-lhes o
terror peloscomunistas
Dá-lhes o
ódio às gentes ele-gê-bê-tê
Dá-lhes
o ressentimento racista
Dá-lhes
a ojeriza pelas feministas
Se
queres alcançar e manter poder
Inventa
anedotas, números e cifras
Dá-lhes
exemplos contra o intelecto
Faze a
curiosidade da ciência adormecer
Dá-lhes
facas sem fio e pregos sem cabeça
Dá-lhes
escolas ruins e maus professores
Dá-lhes
lentes distorcidas para ver o real
Se
queres aliciar os incautos e os tontos
Engendra
e difunde modas e tendências
Dá-lhes
tolos, supérfluos e ridículos modelos
Para
comprarem a prazo e com descontos
Dá-lhes
quepes, uniformes e camuflagens
Dá-lhes
músculos, pistolas e carabinas
Dá-lhes
sacos de lixo para encher de dinheiro
Dá-lhes
o fascínio por quem só diz bobagens
Se
queres manter teu luxo e sossego
Ensina
que cada indivíduo pode tudo
Dá-lhes coachse livros de auto-ajuda
E teu
mal será sentido como chamego
Dá-lhes
a ideia de que só cai quem se solta
Dá-lhes
a culpa sobre o próprio sofrimento
Dá-lhes
a fé que o mais apto sempre vence
Dá-lhes o
alvo certo a quem dirigir a revolta
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