cidadão de bens

poema de Aldo Votto





cidadão de bens


despertos pela flauta teratológica
ressentidos, raivosos e impotentes
encontram outros, outros, mais outros

unidos compartilham seu delírio
apoiam a desrazão, a cólera necrofílica
que fazem gozar seus encantadores

param de ouvir o que faz sentido
deixam de ver o fato que os cerca
viram massa espalhada e ensandecida
uma gosma que escorre para baixo
para os lados, por todos os andares

conseguem ser piores que os ruins
incontroláveis e contrários à razão
seus meios são os seus próprios fins
para destruir destróem para destruir
violentos, assassinos, belicistas 
para abolir abolem para abolir
o outro, o mundo, aos seus e a si

combinam solidariedade doentia 
com absoluta repulsão à razão
que, sem noção, dão como resposta
ao dever de competir para chegar lá
mais rápido, mais alto e mais longe
porque não sabem onde fica o acolá
porque não escolheram tal destino
no fundo, também pensam ser'anti-', 
se opõem, sem atinar, ao que se opõem
aqueles tantos a quem muito odeiam

dividem o mundo em dois andares
no de cima
estão eles, seus ídolos e seus iguais
no de baixo,
estão todos os seus desafetos e avessos
nem cogitam pensar que o mais importante
é o que fazem pela riqueza esses moradores

mas, como não tem apreço pela razão,
preferem a adoração pelo deus trabalho
para quem as gentes são máquinas ruins 
e, segundo o humor dos tempos e chefes,
substituem os judeus pelos comunistas
(e negros, e gays, e mulheres, e umbandistas)
no andar de baixo
e os industriais pelos fazendeiros
(e banqueiros, e generais, e pastores, e milicianos) 
no andar de cima


estão com os ricos enquanto durar
o tempo que a riqueza sirva para destruir
para matar e abolir
e para gerar mais riqueza, só enquanto servir 
para destruir, para matar e abolir
não têm outro projeto, nem plano
a não ser seguir os flautistas do horror
em direção aos ricos domínios de Satanás
que, vez em quando, vem cobrar suas almas.







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