e daí?
poema
de Alvaro Santi
E daí?
“E
daí?” – Disse o tirano
infeliz
que as circunstâncias
conduziram
ao comando
de
um povo cheio de esperança.
“E
daí?” – Repetiu ele
às
câmeras, sorridente,
quando,
na floresta, o incêndio
tornava-se
corriqueiro.
“E
daí? Morreram poucos.”
-
Opinava – “No Brasil,
faltou
matar tantos outros.
Pelo
menos, trinta mil.”
“E
daí se com os radares
que
eu mandei desativar
vão
morrer alguns milhares
a
mais?” - Nem vou comentar.
“E
daí?” – Se alguém achava
que
era suspeito ou estranho
ter
amigos milicianos,
era
a resposta que dava.
“E
daí se eu vou pra rua
e
pego uma gripezinha?
Eu
cuido da minha família,
cada
um cuide da sua.”
“E
daí se aquele avião
que
me levou pra Miami
numa
nefasta excursão
trouxe
do vírus um enxame?”
“E
daí?” – Dizia ele,
quando
alguém lhe perguntava
dos
milhares de doentes
e
corpos que se empilhavam.
“E
daí?” – Só repetia,
sem
sombra de algum respeito,
quem
com a mão faz arminha
e
alega não ser coveiro.
“E
daí?” virou bordão
na
boca desse demente:
se
já faltava caixão,
não
ia ser culpa dele;
e
sim dos governadores,
dos
prefeitos, dos chineses,
dos
vermelhos traidores,
dos
que não votaram nele...
Ou
quem sabe do ministro,
querendo
ofuscar seu brilho?
“E
daí?” – Dirá, por fim,
ao
ouvir sua sentença,
depois
do Juízo Final,
ao
demônio que o receba –
“O
inferno não é tão mau,
em
casa vou-me sentir.”
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